Hoje, am audição com deputados da Assembleia Da República De Portugal, como membro integrante do grupo de trabalho sobre áreas protegidas do CNADS, tive a oportunidade de, em dois minutos, expor algumas ideias sobre biodiversidade, áreas protegidas, e o porquê do fracasso geral da sua gestão em Portugal. Não é um exercício fácil dada a complexidade do tema e exiguidade do tempo mas aqui vai, em traços gerais, o que disse e que completou outras intervenções feitas por Filipe Duarte dos Santos, João Joanaz de Melo, Emanuel Gonçalves, Teresa Andresen e José Guerreiro.

“A biodiversidade é um bem público que, em Portugal, ocorre primordialmente em território privado.

Os privados não gerem o bem público a menos que lhes traga vantagem económica.

A vantagem económica advém, normalmente, da comercialização de bens e serviços.

Acontece que grande parte dos serviços proporcionados pela biodiversidade não está à venda.

Quanto custa a produção de oxigénio?

A regularização do ciclo hidrológico?

A produção de solo?

A polinização das plantas?

O efeito de diluição da biodiversidade na diminuição de propagação de doenças infecto-contagiosas?

O bem estar e equilíbrio emocional das pessoas?

Alegadamente muito.

As contas da OCDE apontam para USD $125-140 triliões (na escala curta), ou cerca seja metade do PIB mundial anual. Só a crise da COVID-19, que não é independente da crise de biodiversidade, representou uma perda de 6.5% do PIB mundial em 2020.

Estas contas são raramente feitas e menos ainda integradas nos processos de decisão. Por isso uma árvore morta vale mais em Portugal que uma árvore viva.

As áreas protegidas, que são reservatório de capital natural, têm vindo a descapitalizar-se década após década. A Arrábida está a ser comida por dentro. A Costa Alentejana está a ser plastificada por fora.

O fracasso da gestão do bem público nas áreas protegidas é um fracasso do Estado e das suas instituições, nomeadamente deste hemiciclo, a quem cabe legislar para resolver o conflito entre a proteção do bem público e o direito de usufruto da propriedade privada.

À esquerda do hemiciclo entenderia uma solução que passasse pela expropriação de terrenos em áreas protegidas, passando a sua gestão para a alçada do Estado.

À direita do hemiciclo entenderia uma solução que passasse pela remuneração aos proprietários privados pelos serviços de biodiversidade produzidos nestas propriedades, em troca de uma gestão contratualizada.

Discussão ideológica aparte, importam soluções que funcionem. Até agora, pouco tem funcionado. O CNADS, em consonância com recomendações da Comissão Europeia, propõe a aplicação do princípio do utilizador pagador nas áreas protegidas.

Na prática, este princípio permitiria complementar a dotação orçamental do Estado, com autofinanciamento proveniente dos utilizadores destas áreas através da cobrança de taxas ou portagens.

Isso sim, seria imprescindível que uma parte significativa dessa verba fosse usada para cobrir custos de gestão efetiva do capital natural, independentemente da gestão ser privada ou pública.”